Mobilidade inteligente: conceito, importância e tendências
Na próxima década, o ecossistema de mobilidade passará por uma transformação ainda não vista desde o aparecimento do automóvel. E uma parte considerável de tal mudança está alicerçada no abandono gradual de carros para uso particular.
A previsão foi feita no estudo The Future of Mobility, divulgado pela McKinsey em 2023. A consultoria destacou que é cada vez mais crescente o número de consumidores preocupados com o meio ambiente e em busca de opções de transporte mais eficientes, ecológicas e convenientes. Entre as tendências a ganhar força nos próximos anos, estão o uso de Roboshuttles, microautocarros autónomos que podem ser compartilhados.
A seguir, entenda mais a respeito do conceito de mobilidade inteligente e seu futuro, tanto em termos de aplicação tecnológica quanto de sustentabilidade.
Leia mais:
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Mobilidade inteligente: impactos no meio ambiente e social
A mobilidade inteligente pode ser entendida como a integração entre tecnologias emergentes e práticas sustentáveis para transformar a forma como as pessoas se deslocam.
O conceito abrange, portanto, várias áreas: uso de veículos autônomos, eletrificação dos transportes, investimento em soluções de pagamento automatizadas e conectividade entre diferentes meios de transporte.
No fim, o principal objetivo da mobilidade inteligente é o de criar sistemas de transporte mais eficientes, seguros, acessíveis e amigáveis ao meio ambiente. Mas sem perder de vista a comodidade de quem os utiliza.
Nesse sentido, a mobilidade inteligente visa não apenas melhorar a eficiência dos sistemas de transporte, mas também torná-los mais sustentáveis. Para tanto, algumas iniciativas podem colaborar:
- Redução de emissões: a partir da massificação do uso de veículos elétricos e de alternativas de combustíveis limpos.
- Integração multimodal: facilitando a integração entre diferentes meios de transporte, como bicicletas, trens e carros compartilhados, para reduzir a dependência de veículos individuais.
- Urbanismo sustentável: ao projetar cidades para serem mais amigáveis aos pedestres e ciclistas, o que de certa forma contribui para reduzir a necessidade de deslocamentos longos.
Desafios da mobilidade
De acordo com estudo liderado pela McKinsey, o segmento da mobilidade é considerado em alta para a atuação de startups e Original Equipment Manufacturer (OEM), ou fabricante original do equipamento que desenvolve novas tecnologias e opções de transporte.
O mesmo levantamento dá exemplos dos obstáculos encontrados ao redor do mundo e que também impactam os brasileiros. Por exemplo, os motoristas em Munique perdem em média 87 horas no trânsito, anualmente. Já em Los Angeles são 119 horas gastas até antes da pandemia.
Estima-se que estejam em circulação 1,3 mil bilhões de veículos, grande parte de uso particular. Apenas nos Estados Unidos, são 868 veículos a cada 1.000 habitantes. Ao se observar outras nações, como a Noruega, o número cai para 635. No México, o dado é ainda menor: 391 automóveis. E quando se pensa na imensidão da população chinesa, a comparação é ainda mais reduzida: 219 por 1.000 habitantes. Contudo, ainda que esse último pareça um número pequeno em relação aos demais, na prática consiste em 300 milhões de veículos.
A McKinsey estima que os carros particulares são usados em 45% das viagens, ultrapassando alternativas de mobilidade como o transporte público, a micromobilidade (como scooters e bicicletas), as caronas compartilhadas e as caminhadas.
O uso de carros que empregam combustível fóssil também impacta a sustentabilidade. Em 2020, o setor de transportes representou cerca de 20% das emissões globais de gases de efeito estufa. O mesmo levantamento da McKinsey detalhou que mais de 40% desse percentual vem de automóveis particulares.
Medidas para tornar a mobilidade eficiente
Mais de 150 cidades já implementaram medidas para reduzir a utilização de veículos privados. Entre as iniciativas, estão a limitação no número de carros particulares nas cidades ou, ainda, incentivos financeiros para usar alternativas.
Ainda segundo informações da consultoria McKinsey, em Pequim, por exemplo, está em fase de implementação um Plano Abrangente da Rede de Trânsito Ferroviário. A proposta visa a expansão do sistema de metrô em 1.625 quilômetros até 2035, tornando o transporte ferroviário majoritário em 27% do transporte público existente.
Já na região sudoeste da China, em Chengdu, está em construção o que está sendo considerada a maior rede de ciclovias urbanas do mundo. Serão 1.920 quilômetros de extensão até 2025 e 17 mil quilômetros até 2040. A cidade está com um objetivo arrojado: tornar-se um local sem carros.
Em Paris, a ideia é tornar a cidade mais propensa às caminhadas. A então prefeita de Paris, Anne Hidalgo, anunciou o projeto 15 minutes-city, com o ideal de fornecer aos cidadãos parisienses e turistas da também conhecida “cidade luz” um lugar onde possam morar, trabalhar, comprar, ter acesso à saúde, educação e entretenimento, tudo acessível em uma caminhada de até 15 minutos.
A pouco mais de 1,5 mil quilômetros de Paris, Oslo, na Noruega, também adota medidas de mobilidade inteligente. Diversas vagas de estacionamento foram simplesmente removidas das ruas do centro, dando lugar a ciclovias, parques e vias de pedestres. A meta da Lei das Alterações Climáticas é reduzir as emissões de carbono em pelo menos 55% até 2030. Já até 2050, a meta é que a cidade se torne um dos lugares em todo o mundo com o menor nível de emissões.
O uso de alternativas aos veículos que utilizam combustível fóssil é uma das principais iniciativas que integram a chamada mobilidade inteligente. (Fonte: Getty Images/Reprodução)
Tendências tecnológicas usadas na mobilidade inteligente
Entre as tendências tecnológicas para a mobilidade estão:
Pagamentos integrados e por aproximação
Tem crescido o uso de tecnologias como RFID, sigla para Radio Frequency Identification, além de recursos inovadores como reconhecimento facial e aplicativos móveis para pagamentos integrados em todos os meios de transporte.
O estudo Futuro da Mobilidade Urbana da Visa destacou a importância de investir nessa frente. Isso porque, de acordo com dados do levantamento, 51% dos usuários que fazem uso regular de transporte público recorrem a quatro ou mais meios de pagamento diferentes todos os meses. Esse fator demonstra que ainda há uma necessidade de unificar e simplificar os sistemas de transporte coletivo.
Outra pergunta feita no levantamento da Visa foi sobre a possibilidade de usar um serviço digital para planejar, reservar ou até pagar de forma antecipada seus meios de transporte. Ao passo que 64% dos entrevistados desejam ter essa facilidade, concentrada em uma única plataforma.
Ainda: 94% deles desejam que haja uma possibilidade futura de fazer pagamentos por aproximação para acessar o transporte público.
E um case já vem sendo aplicado no Brasil, em uma aliança entre Visa e MetrôRio, no Rio de Janeiro. Por lá, foi comprovado que os pagamentos por aproximação diminuem o custo e tempo de implantação, com crescimento de usuários que adotaram esse método: 40% ao mês, com uso médio diário de 1,75 vez por passageiro, semanalmente.
Além de facilitar a vida do usuário ao pagar, a medida encurtou filas, acarretando a percepção positiva de quem usa transporte público, cuja taxa de recorrência no uso dessa modalidade de pagamento é de 97%. Na prática, 9 em cada 10 pessoas utilizam a medida em seus deslocamentos.
Veículos autônomos
Veículos que operam sem intervenção humana utilizando sensores, inteligência artificial e conectividade já são uma realidade em determinados países, como é o caso dos Estados Unidos. Por lá, o que se observa com a aplicação de tal medida é a redução de acidentes causados por erro humano em até 90%, otimização do tráfego, bem como a possibilidade de maior mobilidade para pessoas com deficiência e idosos.
No entanto, embora seja considerada uma inovação, o emprego de veículos autônomos ainda esbarra em desafios, a destacar: questões regulatórias, segurança cibernética, aceitação pública e infraestrutura necessária.
Apesar disso, algumas perspectivas demonstram que os veículos autônomos têm grandes chances de uso e aceitação ao serem integrados ao transporte público, melhorando a eficiência e reduzindo custos. Ainda: em prol de serviços de mobilidade sob demanda, como a Uber em parceria com a Waymo que emprega esse tipo de automóvel.
Veículos elétricos
A adoção crescente de veículos movidos a eletricidade em vez de combustíveis fósseis também tem contribuído com a agenda da mobilidade inteligente. Isso porque entre as vantagens de usar esse tipo de automóvel estão a redução das emissões de gases de efeito estufa, menor poluição sonora e, especialmente, dependência reduzida de combustíveis fósseis.
Apenas em 2022, a venda de carros elétricos representou 15% do total, ou precisamente 847 mil veículos emplacados, de acordo com informações divulgadas em notícia da CNN Brasil. A matéria destaca, ainda, a necessidade de aumentar a produção de lítio, cuja bateria é empregada nesses automóveis.
Mas, assim como acontece com os veículos autônomos, os elétricos também enfrentam obstáculos para que seu uso se torne popular. Entre os desafios, estão a falta de infraestrutura de recarga, a capacidade de armazenamento de energia e a reciclagem de baterias.
Um dos principais entraves para a popularização dos carros elétricos diz respeito ao custo inicial elevado, uma vez que os preços praticados em sua produção são bastante superiores àqueles em automóveis movidos a combustível fóssil. O desenvolvimento de tecnologia e as matérias-primas usadas em seu desenvolvimento são alguns dos fatores que tornam sua produção encarecida.
Free flow
Consistem em sistemas de pagamento automatizados e livres de barreiras para pedágios e estacionamentos. Já existem algumas formas de aplicação, permitindo que os motoristas trafeguem pelas vias intermunicipais com mais facilidade.
Ainda que essa medida não reduza, por exemplo, o uso de veículos particulares, beneficia a mobilidade ao diminuir congestionamentos em pedágios. Além disso, não deixa de oferecer maior conveniência para os usuários, bem como eficiência operacional.
Contudo, nem tudo são flores nessa tendência. Fatores como segurança de dados, interoperabilidade entre diferentes sistemas e regiões, e a própria aceitação do usuário podem dificultar sua popularização.
Paris e Oslo já adotam projetos para fomentar o uso de bicicletas, bem como estimular caminhadas pela cidade, por parte de moradores e turistas. (Fonte: Getty Images/Reprodução)
Oportunidades de negócios em mobilidade inteligente
A partir dos exemplos apresentados, observam-se algumas frentes que podem ser convertidas em verdadeiras oportunidades para as empresas que desejarem surfar na onda da mobilidade inteligente.
IA e sensores
Entre elas, está o desenvolvimento de tecnologias a partir do uso de Inteligência Artificial (IA) e de sensores. Nesse sentido, as empresas podem se especializar na criação de softwares e hardwares para veículos autônomos. Os recursos tecnológicos que podem ser empregados no contexto estão desde algoritmos de IA até câmeras e sensores LiDAR.
No caso desta última inovação, ela diz respeito ao sistema de Light Detection and Ranging (LiDAR). Basicamente, é uma tecnologia de sensoriamento remoto que utiliza luz na forma de um laser pulsado para medir distâncias.
Funciona assim: o dispositivo com LiDAR emite pulsos rápidos de laser em várias direções, atingindo objetos e superfícies no ambiente e, depois, eles são refletidos de volta para o sensor. O sensor mede o tempo que cada pulso de luz leva para retornar ao emissor, usando a velocidade da luz para calcular a distância entre o sensor e os objetos.
Tudo é feito a partir do tempo de retorno dos pulsos. E é a partir disso que é possível criar uma nuvem de pontos, como pode ser chamada a representação tridimensional do ambiente em que a tecnologia é usada.
O LiDAR é crucial e usado em veículos autônomos. É essa tecnologia que permite tais automóveis de “ver” o ambiente ao redor em 3D, auxiliando na navegação, identificação de obstáculos, pedestres, outros veículos e na própria sinalização das vias.
Infraestrutura de recarga
Entre as possíveis soluções, estão aquelas relacionadas ao desenvolvimento de tecnologia de recarga ultrarrápida, já que uma das grandes dores dos usuários é o tempo de espera para tanto. Por exemplo, estima-se que um carro elétrico com bateria de 24 kWh leve até 7 horas para ser recarregado totalmente.
Assim, uma saída é criar formas de oferecer recargas em poucos minutos, utilizando sistemas de alta potência (150 kW ou superior), bem como em ampliar as estações inteligentes. Ainda: integrar um software que otimiza o uso da energia e ajusta dinamicamente a potência de recarga também são possíveis oportunidades de negócio.
A montadora Tesla, que também vende veículos elétricos, desenvolveu a tecnologia Supercharger, que permite o recarregamento em até 15 minutos. Com esse tempo, seria possível percorrer até 200 milhas, o equivalente a 320 quilômetros.
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Referências:
McKinsey, Poder 360, Transformative Mobility, Visa, Revista L'Officiel, Época Negócios, CNN Brasil, Forbes Brasil, Insper, NeoCharge.