Ambidestria organizacional: o que é e como colocá-la em prática
Com diversas reviravoltas que ocorreram nos últimos anos, as corporações precisaram, mais do que nunca, apostar no poder da adaptação. Para tanto, também foi preciso uma boa dose de alinhamento dos objetivos e de ajustar a jornada.
Sobretudo para os negócios cuja estrutura era pautada nos modelos tradicionais aplicados antes da chamada Quarta Revolução Industrial que, por sua vez, é orientada por sistemas físico-cibernéticos. Nesse sentido, especialmente nos últimos anos, o que se viu foi uma corrida para se adequar à transformação digital.
E é aí que as duas necessidades, adaptação e alinhamento, devem andar de mãos dadas, o que vem ao encontro da ideia de ambidestria organizacional. É sobre ela que você vai conferir nas próximas linhas
Trataremos a seguir sobre:
- O que é ambidestria organizacional?
- Ambidestria estrutural
- Ambidestria contextual
- Perfil dos indivíduos ambidestros
- Relevância da ambidestria organizacional para fomentar a inovação
- 5 formas de tornar a ambidestria organizacional uma realidade nos negócios
Boa leitura!
O que é ambidestria organizacional?
A ambidestria organizacional pode ser definida como o equilíbrio entre o olhar para inovação, com foco no futuro, e a eficiência das operações no presente.
O então professor de gestão estratégica da London Business School, Julian Birkinshaw, e a professora de organização e estratégia da Universidade da Califórnia, Cristina Gibson, trataram sobre o conceito em um artigo clássico a respeito do tema no MIT Sloan Management Review em 2004.
Na ocasião, os autores realizaram uma pesquisa envolvendo entrevistas a representantes e liderados das principais multinacionais. E muitas dessas deixaram a desejar em termos de ambidestria. Para tangibilizar o conceito na prática, eles recorreram a dois desdobramentos: a ambidestria estrutural e a ambidestria contextual.
A ambidestria organizacional tem sob seu imenso guarda-chuva dois outros tipos: a estrutural e a contextual. Com ambas, é possível fortalecer e inovar os negócios. (Fonte: Getty Images/Reprodução)
Ambidestria estrutural
Dentro de uma corporação, cada atividade necessita de equipes dedicadas. Essa é a base da ambidestria estrutural, segundo a qual as tarefas voltadas à adaptabilidade e ao alinhamento são feitas em unidades separadas, dedicadas ao core business e à inovação.
Assim, cada pessoa dentro de uma unidade tem um papel específico nas equipe,s de forma clara e pré-definida. E geralmente têm uma postura de especialistas no que fazem.
Ambidestria contextual
A ambidestria contextual, por sua vez, deve ser operacionalizada de forma complementar. Isso porque diferente da estrutural, nesta, cada um dos funcionários expande e coloca o conceito em prática a partir de sua atuação individual.
Cada pessoa dedica parte de seus esforços tanto em adaptabilidade quanto em alinhamento. A partir do seu próprio julgamento, definem qual dessas necessidades precisa de atenção no momento.
Suas atividades são orientadas de acordo com as demandas apresentadas pelo alto escalão. Porém, como precisam individualmente atuar pensando não só em adaptação como no alinhamento que lhes foi atribuído, suas funções costumam ser mais flexíveis, necessitando, portanto, de um conhecimento generalista.
Perfil dos indivíduos ambidestros
Para entender quais são as habilidades dos indivíduos ambidestros em nível contextual, os pesquisadores Birkinshaw e Gibson entrevistaram executivos e trabalhadores da linha de frente para descobri-las e chegaram aos seguintes aspectos:
1. Indivíduos ambidestros são proativos e estão atentos às soluções para além do que costumam fazer em suas funções
Vamos a um exemplo citado pelos próprios autores: um gerente que, ao negociar um software para um cliente, percebeu que ele tinha uma necessidade específica.
Assim, ao invés de simplesmente vender o que já estava no portfólio da corporação, desenvolveu um estudo de caso e um projeto de um novo módulo de software que atendesse aquelas necessidades.
O gerente submeteu a ideia aos tomadores de decisão da empresa em que atuava e, após receber o retorno positivo, deu sequência junto ao time de desenvolvimento.
2. Indivíduos ambidestros também apresentam uma maneira de agir mais colaborativa, criando vínculos significativos
Embora cada indivíduo tenha certa autonomia para agir de acordo com a adaptabilidade e os alinhamentos recebidos pelos administradores do negócio, quem tem uma postura ambidestra tende a ser mais cooperativo.
Assim, Birkinshaw e Gibson elaboraram um novo exemplo para facilitar a compreensão. Uma gerente de marketing de uma multinacional estava com dificuldades para reorganizar as atividades de uma subsidiária recém-comprada.
Assim, para encontrar soluções de forma proativa, a gerente mobilizou discussões trimestrais sobre boas práticas com colegas de trabalho de outras filiais espalhadas em diversos países.
3. Indivíduos ambidestros costumam ser multitarefa
Para os autores, os indivíduos ambidestros têm uma atitude multitarefa. E assim o fazem a partir da proatividade, ao desenvolver um olhar macro e entender quais funções são necessárias em benefício do objetivo que precisa atingir.
Por fim, os pesquisadores ressaltam que os pontos em comum de cada uma dessas habilidades residem nas seguintes capacidades:
- agem fora dos limites pré-estabelecidos para as atividades, olhando para os interesses mais amplos da companhia;
- atuam de forma adaptativa, mas alinhada aos objetivos da organização;
- são motivados e partem para a ação de forma espontânea.
Contudo, para que esses profissionais ambidestros possam agir individualmente no contexto em benefício da estrutura, a cultura da organização precisa respirar a ambidestria.
Porém, tudo isso pode ser limitado quando os administradores têm uma postura mais fechada. Isso porque se houver a necessidade constante de autorização para cada atitude a ser tomada pelos subordinados, os indivíduos ambidestros terão suas habilidades restringidas.
Pegando o último ponto destacado, a cultura vivida pelas startups tem a ensinar. Sobretudo no sentido de incentivar os membros de uma equipe a serem mais independentes e flexíveis ao partir para a ação em suas linhas de frente.
Os profissionais que atuam em nível contextual precisam dispor de liberdade para serem proativos e agir, em termos de adaptabilidade e de alinhamento. (Fonte: Getty Images/Reprodução)
Relevância da ambidestria organizacional para fomentar a inovação
A cultura da inovação pode ser estabelecida dentro de uma corporação quando a ambidestria estrutural abre espaço para que a contextual seja plenamente desenvolvida.
Para tanto, a atuação de alguns players dentro do negócio precisa estar alinhada como em uma “trindade corporativa”.
Em artigo publicado no MIT Sloan Management Review Brasil, Luís Rasquilha, Fausto Ferreira e Marcelo Veras advogam a ideia de três entidades organizacionais que precisam agir conjuntamente: gestão, propriedade e conselho. Todos devem ter em seu norte a longevidade da corporação.
E, para tanto, a ambidestria das ações do presente devem andar de mãos dadas com aquelas a serem empreendidas em prol do futuro do negócio e de sua sobrevivência no mercado.
Para alcançar a ambidestria, os autores sugerem que a trindade organizacional haja da seguinte forma:
- buscar a educação em termos de ambidestria e investir em ferramentas e metodologias para operacionalizar a gestão da mudança;
- desenvolver-se, em esfera individual, a partir dos mesmos conceitos, identificando o que precisa ser mais bem trabalhado em termos comportamentais, de competência e de ruptura com modelos mentais limitados.
Assim, enquanto estruturalmente e em nível contextual todos agem para garantir a eficiência das entregas no presente, dedica-se parte da atenção à inovação. Isso ocorre ao fomentar atualizações dos produtos e serviços e o que precisa ser transformado em prol do futuro da empresa.
Leia também:
- Benchmarking: importância para os negócios de startups
- Colaboração e inovação: importância e impacto nos negócios
- Negócios de impacto: o que são e qual é o papel deles na sociedade
Estudo de caso: o desempenho da Oracle
Contudo, a ação da trindade organizacional precisa estar constantemente aberta para provocar mudanças. Birkinshaw e Gibson citam, entre os vários estudos de caso apresentados, o da Oracle, e de como criar um contexto organizacional de alto desempenho.
Durante algum tempo, a Oracle estimulou em sua cultura organizacional a competitividade de uma forma agressiva visando o alto desempenho. O que, com o passar do tempo, beirou ao esgotamento dos envolvidos, embora a remuneração dos funcionários fosse boa.
Assim, o apoio social para além do trabalho se tornou uma necessidade na corporação. Foi desenvolvido um sistema de Balanced Scorecard (BSC), que pode ser traduzido como um processo para avaliar os Indicadores Balanceados de Desempenho. O método foi criado pelos professores da Universidade de Harvard, David Norton e Robert Kaplan.
A metodologia de BSC funciona para medir a gestão do desempenho de um negócio. É operacionalizada da seguinte forma: mede-se o progresso da corporação em termos de lucro, avaliando os potenciais riscos e analisando as metas de médio e longo prazo.
Na BSC, os valores da organização devem orientar todas as ações visando a prosperidade no futuro, ainda que durante o percurso ocorram algumas perdas. Com isso, o que foi feito no passado é avaliado, corrigido no presente, visando sua transformação para atingir o sucesso em um futuro próximo ou distante.
Desse modo, a partir do modelo de BSC, os 275 principais gestores da Oracle se reuniam regularmente para compartilhar ideias e rever o que estava sendo feito. Ou seja, se em determinado ponto a corporação esteve totalmente orientada a desempenho, com o passar do tempo percebeu a necessidade de construir laços de suporte e de confiança entre seus colaboradores.
Metas estabelecidas, análise de desempenho individual e gerenciamento de risco foram algumas das atitudes tomadas pelos administradores da Oracle e citadas pelos funcionários da organização entrevistados por Birkinshaw e Gibson. Dessa forma, foi possível colocar em prática a ambidestria organizacional.
No entanto, quando acontece o contrário e os funcionários agem sem foco no desempenho ou, quando ele impera, não há confiança ou apoio em suas jornadas. Como consequência, a baixa eficiência e prejuízos psicológicos podem se tornar uma realidade.
Ao permitir que os funcionários tenham uma maior flexibilidade e autonomia em suas funções, promove-se a circulação de ideias. Em consequência, a inovação é potencializada. (Fonte: Getty Images/Reprodução)
5 formas de aplicar a ambidestria organizacional nos negócios
Confira as 5 dicas elencadas por Birkinshaw e Gibson para aplicar a ambidestria organizacional em uma corporação:
1. Avalie como está sua corporação
Para entender o contexto de como as pessoas atuam em seu negócio, é preciso considerar como ele está e de que forma ocorre a gestão de desempenho; se há algum tipo de apoio social aos colaboradores e como é feito; e como ocorre o equilíbrio entre os dois.
Tal qual no exemplo da Oracle, para que a ambidestria organizacional possa ser uma realidade, é preciso que a eficiência ande em conjunto com o apoio dos funcionários. Somente assim é possível obter sucesso em termos de desempenho, mas também de motivação para fazer a corporação caminhar saudável no presente rumo ao futuro.
2. Concentre-se em alavancas
Compensação de incentivos ou mesmo a gestão de riscos são formas de alavancas que fornecem o impulso necessário que o seu negócio precisa. Porém, existem outras tanto para otimizar o desempenho quanto para servir como apoio social das equipes.
O apoio social, por exemplo, pode ser realizado ao conceder benefícios extras aos funcionários, ou estimular o seu desenvolvimento educacional por meio de qualificações. Dessa forma, eles perceberão que são valorizados e se sentirão pertencentes ao negócio, favorecendo a proatividade e o sentimento de “dono”.
Contudo, tais fatores devem ser promovidos pela corporação de uma forma consistente. Desse modo, haverá um sentimento generalizado de confiança no ambiente de que aquela é a nova realidade e cultura praticadas na corporação.
3. Permita que todos conheçam os próximos passos do negócio
Os autores também avaliaram em sua pesquisa o quesito comunicação e o quanto os liderados estavam cientes sobre os rumos da corporação. E identificaram um ponto: em muitas empresas, quanto mais distante da alta liderança o colaborador se encontrava, menos conhecimento ou poder de decisão tinha acerca das metas e dos objetivos de médio e longo prazo. Os pesquisadores nomearam esse problema como “efeito erosão”.
Nesse contexto, Birkinshaw e Gibson avaliaram que as corporações com um índice de comunicação baixo entre aqueles que trabalhavam na linha de frente tinham um menor desempenho, desfavorecendo a ambidestria.
A falta de conhecimento dos liderados sobre os próximos passos da corporação pode influenciar negativamente no alcance do alto desempenho. Portanto, comunicação é a chave. (Fonte: Getty Images/Reprodução)
4. Ambidestria contextual e estrutural devem ser complementares
E para que a ambidestria organizacional seja uma realidade na corporação, tanto o contexto quanto à estrutura devem seguir juntos no que diz respeito a gestão, estratégia e execução de ações em prol de um objetivo.
A ambidestria é orientada a partir do poder de adaptabilidade e do alinhamento, geralmente separados em termos estruturais. E é no contexto que ambos são implementados em conjunto. Logo, o ideal é que o contexto haja de forma complementar à estrutura.
5. Ambidestros contextuais devem ser vistos como “impulsionadores da liderança”
Mais do que serem orientados pelos tomadores de decisão responsáveis por definir as ações em termos estruturais, os liderados que atuam com ambidestria contextual também devem impulsionar a liderança.
A ideia é que a alta liderança seja impactada pela inovação e olhar de eficiência dos demais colaboradores, contribuindo com a evolução do negócio.
Em resumo, a ambidestria organizacional promove maior colaboração, flexibilidade, motivação e liderança em prol da adaptação frente aos desafios no presente, com o fôlego necessário para manter o negócio vivo no futuro.
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Fonte: MIT Sloan Management Review